terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Outra Face - Gibis x Vida Real: Os homens preferem as más (mas casam com as boazinhas) (Por Fernanda Cirenza - Marie Claire)

A realidade inspira a ficção quando o assunto é a relação entre homens e mulheres. É só lembrar como as personagens mais sedutoras dos gibis balançam á anos o coração dos heróis. Como na vida real as qualidades físicas das garotas de papel fazem toda a diferença.

Acontece no mesmo jeito no mundo sem fantasia. As criaturas femininas mais sexy dos gibis, aquelas de corpos esculpidos por uniformes colantes, abalam até mesmo os corações dos heróis. Atire a primeira pedra quem nunca nesta vida tentou ser a Mulher Gato, a vilã que desperta desejos em Batman, coisas que só os homens de verdade podem desfrutar e que as mulheres reais adoram provocar. Perto dela, a boa moça Batgirl fica em segundo plano. Pena que nas histórias em quadrinhos, as mulheres mais bacanas são sempre as vilãs.

Em sua tese “Mulher ao quadrado”, Selma Regina Nunes Oliveira, professora de Comunicação da Universidade de Brasília que pesquisou as personagens dos gibis americanos entre 1895 e 1990, diz que as namoradas dos heróis representam o padrão social idealizado: bonitas, bondosas, leais, ingênuas. “A virgindade de mocinha é quase um dogma, e a fragilidade dela valoriza a virilidade do herói.” Já as vilãs são, nas HQs, o desvio das normas sociais: sensuais, traiçoeiras, espertas, atrevidas. Na prática, elas representam a decência e a indecência, ou se preferir, a mulher e a amante.

É só lembrar da astúcia de Satin, a morena gostosa que balança o coração de Spirit, que não larga a namorada certinha, Ellen, que por sua vez, só pensa em se casar com o herói. Ou da primeira heroína cheia de sex-appeal, a hoje só engraçadinha Betty Boop. Apesar do bom coração, ela usava vestidos curtos, salto alto e uma liga nas coxas. No passado, claro, foi censurada.

Muita coisa mudou nos gibis nos últimos tempos. Para Selma Regina, as mulheres fantásticas evoluíram de acordo com a sociedade. Batgirl, que agora se chama Oráculo, vive numa cadeira de rodas desde que foi baleada por Coringa e ajuda Batman por meio da internet; Mulher-Gato está mais sarada; e alguns heróis até casaram, como Fantasma e a linda Diana Palmer, ou Superman e a gatíssima Lois Lane – fato que, anos atrás, era impossível, porque herói que era herói tinha de ser livre para viver suas aventuras.

Até as heroínas dos gibis estão carregadas de sensualidade. Jean Grey, dos quadrinhos de X-Men, além de bonita, jovem e poderosa, derrota os vilões com facilidade, mas não descarta um salvamento masculino quando se mete numa enrascada. Mesmo a nova versão da Mulher-Maravilha ganhou peitos mais fartos e pernas mais musculosas. É o sinal dos tempos, da vida nas academias, do botox e do silicone. Resumindo: a mulher, boa ou má, quer ser linda e provocante. Uma característica nada fictícia.

Para o psiquiatra e psicoterapeuta Auro Lescher, as personagens das HQs, assim como as de lendas e mitos, representam os arquétipos, que são as estruturas básicas da alma humana. “É natural estarmos sintonizados com essas figuras. Seremos mais saudáveis se estivermos disponíveis para essas diferentes características.” Então, não há nada de “errado” em encarnar o papel que for na vida real. A seguir, três histórias verdadeiras de um homem e duas mulheres que vivem um pouco como no mundo dos quadrinhos. Ele se divertia com as “más”, mas se casou com a mocinha. Entre as mulheres, uma é vilã confessa no que diz respeito à estética, mas não assume a falta de caráter das personagens, e a outra se encaixa no estereótipo da boa moça.

O Protagonista Modelo

“Eu nunca descartei a idéia de casar, ter filhos, mas não pensava seriamente nisso. Fui levando a vida e tive sorte com as mulheres. Gostava das extravagantes, sensuais, chamativas. O meu tipo, alto, loiro e de olhos azuis, agrada a mulherada.
Na juventude, usei minha aparência pra conquistar e só me interessava pela aparência das mulheres. As morenas altas e magras eram as minhas prediletas, e os casos mais quentes que tive aconteceram com parceiras mais velhas que eu. Adorava uma trintona.
Cheguei até me apaixonar por uma, a Sandra. Eu tinha 17 anos, estava no primeiro ano de direito, quando a conheci. Ela, 28 anos, médica. Além de independente, tinha experiência sexual suficiente para me deixar maluco. Minha história com ela durou uns dois anos e só terminou porque, como toda mulher, uma hora ela quis casar e casou com um psiquiatra.

Minha primeira namorada séria, dessas que te levam para jantar na casa dos pais, foi Roberta. Ao mesmo tempo que levava o namoro, pulava a cerca. Sexo, pra mim, não tinha nada a ver com vida a dois, amor, essas coisas. É claro que um dia ela descobriu e me deu o fora.

Nessa época fui morar sozinho. Aí a farra foi total e, para variar, não me liguei em ninguém, com exceção de Patrícia. Publicitária, recém-separada e mãe de duas crianças, era totalmente liberada com relação a sexo. Não tinha frescura para nada e me paparicou muito. Tivemos um longo caso, que durou uns três anos. Eu saía com outras, e sabia que ela também tinha outros. Nosso romance acabou quando ela resolveu voltar a sair com o pai dos filhos dela. Dessa vez, fiquei arrasado.

Como ela teve a coragem de me trocar pelo ex?

Enquanto todos os meus amigos casavam e tinham filhos, eu continuava na vida. E como tem mulher dando sopa por aí. Homem sozinho nunca volta para casa de mão abanando, é impressionante. Um dia fui apresentado a Tatiana, durante uma reunião profissional. Eu estava com 40 anos e saquei que ela era bem mais nova.

Como de costume, fiquei paquerando e me excitei várias vezes. Não consegui entender se ela estava gostando ou não das investidas. Fiquei inseguro e no fim da reunião, como quem não quer nada, trocamos os nossos cartões. Três dias depois, telefonei. Comecei a conversa meio em tom profissional, ela riu e, lá pelas tantas, fiz o convite para jantarmos fora. Fui buscá-la na casa dos pais dela. A mãe a acompanhou até o portão, e eu não acreditei. O encontro foi ótimo, apesar da discrição dela. Em nenhum momento, Tatiana, que me contou ter 26 anos, demonstrou qualquer sinal de tesão por mim. Aquilo me intrigou e, quando a noite acabou, não consegui sequer insinuar passarmos a noite juntos.

Fui para casa imaginando mil coisas. Será que ela é virgem? Não, não pode ser. Não existem garotas dessa idade virgens. Será que não gosta de sexo? O que estou fazendo com essa menina?

Na aparência, Tatiana não tem nada de vamp ou independente. Está mais para conservadora, apesar de ter um jeito meio maroto, de garota. Saímos outras vezes e fui descobrindo que ela também não tem nada de extravagante no comportamento. Teve dois namorados. O primeiro, ainda menina, só pegou na mão. Com o segundo, iria casar com ele, mas o cara morreu num acidente de carro.A cada encontro, ficava louco de tesão por ela, sempre meiga, meio tímida.

Aquilo me transtornava e, ao mesmo tempo, tomava o maior cuidado para não ofende-la. Nosso primeiro beijo e nossa primeira transa aconteceram um mês depois. Adorei encaixar nela, pequenininha, delicadinha e até um pouco safada, o que me surpreendeu. Em seis meses nos casamos. Acho que a juventude, a pureza, a ingenuidade de Tatiana me encantaram e continuam me encantando. Ela é uma mulher simples, sem complicações emocionais. Não é do tipo que cobra amor eterno e me dá segurança suficiente para pensar que ela é a mulher da minha vida. Estamos juntos há três anos e temos um filho, João, de 1 ano e 8 meses. Estou tão feliz com a minha família que a única coisa da qual me arrependo é não ter conhecido a Tatiana antes.”

Pedro, 43, advogado

As Histórias de Uma Vamp

“Não quero aparecer alguém sem modéstia, mas sou bonita e minha beleza é uma confiança que tenho. Muitas vezes passei por vilã, porque consigo conquistar com facilidade. Muitas mulheres me odiaram por eu ser assim. Não é algo que eu provoque o tempo todo, mas chamo atenção mesmo sem querer.

Quando eu era jovem, com 17, 18 anos, não me sentia feliz. Mulher bonita é um problema, porque os homens têm medo de chegar perto, e as outras mulheres, inveja, despeito. É quase como levar uma vida meio solitária. Talvez por isso eu tenha casado cedo, aos 22 anos.

Meu primeiro marido, um médico bem-sucedido e dez anos mais velho que eu, me encantou. Namoramos um ano e meio e casamos. Eu achava que ele era o homem da minha vida, estava apaixonada. Os primeiros meses foram mágicos.

Passamos nossa lua-de-mel na Europa e voltei cheia de planos. Queria ser uma boa esposa, uma mulher dedicada. Três meses depois fiquei grávida. Foi uma felicidade imensa para nós dois, mas, e apesar disso, passamos a transar menos e menos.

Quando minha filha nasceu, a coisa desandou de vez. Eu cheia de amor pra dar, com 24 aninhos e um monte de fantasias sexuais, e meu marido nada. A diversão dele era me levar para jantar fora com os amigos. Fiz o que pude para esquentar a relação, até de odalisca me vesti para ele. Mas não adiantou, ele riu de mim, achou tudo aquilo uma bobagem. Eu ficava péssima com isso, porque achava que o problema era comigo, eu é quem não conseguia provocar tesão nele.

De odalisca, passei a encarar o papel da mulher certinha. Também não adiantou. Hoje eu sei que o problema não era meu, era dele, que não gostava de transar. Nosso casamento durou mais um ano assim. E eu percebendo cada vez mais que outros homens me achavam interessante, bonita e atraente. Aí não deu mais, perdi a separação. No início fiquei triste, abalada, mas consegui sair do buraco rapidinho. Tenho uma predisposição à felicidade que é fantástica. Em seis meses comecei a badalar, conhecer gente nova. Passei a assumir o meu jeito de mulher vamp mesmo, que tanto o meu primeiro marido achava ridículo.

Não sou nada tímida e me produzo bem sexy, alem de ser extremamente feminina. Uso muita saia, muito vestido, decote, peças coladas ao corpo e salto alto sempre. No rosto, só batom e rímel, mas meu atual namorado adora quando me pinto mais. Também cuido do corpo e vivo no cabeleireiro.

Fora minha beleza e minha vaidade, sou uma mulher culta. Já viajei meio mundo e falo seis idiomas – português, inglês, francês, espanhol e árabe -, o que também é um problema para muitos homens. Eles se assustam com pessoas, especialmente mulheres, que podem ser mais capazes intelectualmente.

Já fui muito maltratada por causa disso. Tive um namorado que sempre acabava comigo. Um dia chegou a me dizer que jamais teria algo sério comigo. Foi o fim de tudo. O que sinto é que os homens não assumem uma relação quando têm uma mulher muito interessante ao seu lado. Sentem ciúme, raiva e insegurança, porque acham que podem ser trocados a qualquer momento.

Mas quem me trocou por outra foi meu segundo marido, com quem vivi dez anos. Na época, fiquei mal, angustiada, arrasada mesmo. E quis saber dele: ‘Você acha que ela é mais bonita do que eu?’ Ele dizia: ‘Você é mais bonita e inteligente, mas ela tem mais a ver comigo’. Foi assim.

Fiquei triste à beça, mas superei e, com o tempo, fui entendendo certas coisas. Tenho uma amiga que é chefona numa grande empresa. Ela também sofre com os homens, que se sentem diminuídos perto dela. Às vezes, ela mente, diz que é uma profissional qualquer, só para viver suas aventuras. Homem é um bicho muito esquisito.

O meu atual namorado é um homem feio, mas um absurdo de charmoso. É um conquistador nato, genioso. A gente se dá super bem em todos os aspectos: sexualmente, no papo, no dia-a-dia. Está sendo ótimo. Ele também me vê como uma mulher maliciosa, erotizada, picante. E eu adoro isso. Tenho algumas amigas, mas muitas mulheres me vêem como inimiga, sentem raiva de mim.

É como se eu fosse uma ameaça a elas. Se encontro com um amigo com sua companheira, ela logo agarra o braço dele, se pendura nele. Não gosto de parecer uma devoradora de homens, até porque não sou nada disso, jamais entraria numa disputa fútil. Mas é assim que me vêem. Hoje não carrego mais culpa nem tristeza por ser desse jeito, mas já sofri por causa disso.

Há uns anos, uma amiga deixou escapar que só saía comigo porque eu atraía os homens, servia como isca para ela. Fiquei chocada, demorei a entender como tinha levado nossa amizade tanto tempo. Depois, pediu desculpas, falou que não quis dizer o que disse. Mas perdi a confiança, o afeto.

Sou desse jeito, não há o que eu possa fazer para muda-lo até porque agora gosto de ser assim e me sinto envaidecida de ser paquerada, de os homens virarem o pescoço para me ver. Só quero me divertir e, se possível, ao lado de um grande amor como agora.”

Bianca, 38 anos, economista

O Roteiro da Boa Moça

“Eu até gostaria de fazer o gênero mais sexy, mas não levo jeito para a coisa. Já tentei, mas me dei mal, não conseguia ficar no salto alto, ou a alcinha do vestido sempre caía pelo ombro, me deixando completamente sem graça. Nunca me senti à vontade nessas situações.

Desde menina sou assim, fechada, conservadora. Esse meu comportamento não tem nada a ver com a educação que meus ais me deram. Eles até que eram razoavelmente liberais, mas nasci assim. Conheci meu marido quando eu tinha 14 anos. Ele é dez anos mais velho do que eu e me paquerava direto. Nossa, ficava vermelha só de pensar no que aquilo pudesse me levar.

Morria de vergonha dele, dos outros, ficava imaginando o que as pessoas poderiam pensar de mim, uma menina, apaixonada por um homem.

Eu era tão tímida, mas tão tímida, que precisei de um ano para aceita-lo como meu namorado. A gente se casou quando eu tinha 16 anos e, um ano mais tarde, nasceu minha primeira filha. Para o mundo fora de casa, nada mudou em mim, pelo contrário. A maternidade me deixou mais focada nessa coisa de família, de ninho mesmo.

Apesar de ter namorado e casado com o mesmo homem, jamais pensei em conquistar seja lá quem for pelo meu visual, apesar de eu ser uma mulher bem ajeitada. Tenho 32 anos, 1,70m, 55 kg, cabelo e olhos castanhos. Sempre me cuidei, gosto de fazer unha, cabelo, depilação. Mas não consigo usar minissaia. Vestidos, só na altura do joelho. Decote, então, nem se fala.

Gustavo, meu marido, vira-e-mexe me dá um presente mais ousado: uma blusa decotada, um sapato de salto bem alto, um batom vermelho. Mas não consigo sair por aí me expondo. Ele não me cobra uma postura diferente, acho que até gosta do meu recato. Agora, entre quatro paredes, a situação muda. Sou ousada com ele e gosto disso, de poder me soltar na hora H. estamos juntos há 16 anos, é tempo. Nos damos muito bem.

Nunca me achei chata e também não julgo ninguém. Se a mulher quer ser vamp, bom pra ela. Mas não gosto que os outros me critiquem. Não faço o papel da freira, sigo minha vida no estilo mais tradicional. Saio, me divirto, tenho amigos. Não levo uma rotina monástica, mas não aposto em mim mesma como uma mulher extravagante.”

Rita, 32 anos, artista plástica

Por Fernanda Cirenza (Publicada, originalmente, na revista Marie Claire)

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